sexta-feira, abril 22, 2005

Quis

Quis abraçar-te
Mas longe demais voaste
Vento, lento em desalento
Procurando nesse voo
A liberdade do momento
Encontrando nesse tempo
A verdade do sentimento…
Quis dizer-te
Como um mendigo
- Obrigada senhor vento,
Por passar e falar comigo…
Dizendo palavras que vão
Mas existiram ali
E existirão para lá do fim
Quando outros ventos passarem
E noutros corpos tocarem
Falando consigo de si mesmo
Até serem frio e nos gelarem
Como eu gelo aqui agora
Petrificada aqui fora
Agarrada a este abraço
Que me cerca na demora
De ser mendigo nesta hora
Voando como vento que chora
Uma canção da tua cor
Para acalmar o tempo
E faze-lo ser mais amor.



Cathy

quinta-feira, abril 21, 2005

A Volta da Mulher Morena

Meus amigos, meus irmãos, cegai os olhos da mulher morena
Que os olhos da mulher morena estão me envolvendo
E estão me despertando de noite.
Meus amigos, meus irmãos, cortai os lábios da mulher morena
Eles são maduros e úmidos e inquietos
E sabem tirar a volúpia de todos os frios.
Meus amigos, meus irmãos, e vós que amais a poesia da minha alma
Cortai os peitos da mulher morena
Que os peitos da mulher morena sufocam o meu sono
E trazem cores tristes para os meus olhos.
Jovem camponesa que me namoras quando eu passo nas tardes
Traze-me para o contato casto de tuas vestes
Salva-me dos braços da mulher morena
Eles são lassos, ficam estendidos imóveis ao longo de mim
São como raízes recendendo resina fresca
São como dois silêncios que me paralisam.
Aventureira do Rio da Vida, compra o meu corpo da mulher morena
Livra-me do seu ventre como a campina matinal
Livra-me do seu dorso como a água escorrendo fria.
Branca avozinha dos caminhos, reza para ir embora a mulher morena
Reza para murcharem as pernas da mulher morena
Reza para a velhice roer dentro da mulher morena
Que a mulher morena está encurvando os meus ombros
E está trazendo tosse má para o meu peito.
Meus amigos, meus irmãos, e vós todos que guardais ainda meus [últimos cantos
Dai morte cruel à mulher morena!

Vinicius de Moraes

sexta-feira, abril 08, 2005

Como Seria a Vida?

Seria como o Inverno...
Quando a noite corta
E o frio entra pela porta
Fazendo gelar qualquer inferno!



Seria assim o caminho
Sem luz, sem calor...
Sem certeza, sem beleza...
Seria assim a vida sem amor.
Seria como o Outono
Com folhas a cair
Das árvores outrora no trono
Imperiais no modo de sorrir.
Seria assim o momento
Sem vontade, sem liberdade,
Sem rumo, sem fervor...
Seria assim a vida sem amor.



Seria o mundo sem Primavera
Quando não há flores coloridas
E o vento roda a esfera
Até sermos corpos sumidos...
Seria como te matar
Sem sequer te poder tocar
Seria escavar no peito uma ferida
Que viveria sempre a sangrar.
Seria assim a dor
Enorme e sem medida
Aquela que chora por amor
Se ele não exitisse na vida.
Cathy